domingo, abril 17, 2005

VIRIATIS - vol. I, nº II, ano de 1957 (6/12)

MATERIAIS ARQUEOLÓGICOS DO CONCELHO DE SINTRA NA CASA MUSEU «TEIXEIRA LOPES»

por F. RUSSELL CORTEZ, Bolseiro do Instituto de Alta Cultura

Visitando em 19 - XI - 949 a Casa-Museu Teixeira Lopes, hoje património da Câmara Municipal de Gaia, encontrei numa vitrine dois pequenos caixotes com objectos arqueológicos, da Idade do Bronze.

Ao Exmo. Director daquela Casa-Museu, o Escultor Teixeira Lopes, agradeço todas as facilidades dispensadas para o estudo destes objectos.

Um papel escrito, na tampa dos caixotes, esclarecia a sua proveniência: QUINTA DO SALDANHA, SETEAES, e, THOLHOI DO VALE DE S. MARTINHO.

Os informes manuscritos transcritos não têm assinatura. Por ter o maior valor para os interessados no estudo das formas culturais que entre nós acompanham o Vaso Campaniforme, publicam-se hoje uns tantos objectos que encontrados foram nas, actualmente tão desmanteladas, sepulturas do Vale de S. Martinho, e da Quinta do Saldanha, a Seteais, do Concelho de Sintra.

Desviado hoje, com bastante mágua, dos estudos pré-históricos, não bordo qualquer comentário, e muitos me ocorrem ao escrever desta, deixando as ilações aos estudiosos deste tão importante período da nossa história. Realizando a importância destes materiais, publicam-se objectivamente, simultâneamente aos informes situacionais de meu conhecimento.



OBJECTOS ENCONTRADOS NA QUINTA DO SALDANHA, SETEAES - SINTRA

Segundo o escrito, junto à tampa do pequeno caixote onde estes materiais, pertencentes à época do Vaso Campaniforme, se encontravam, foram eles encontrados, a Seteaes, na Quinta do Saldanha.

«Estes objectos de pedra e de barro apareceram nas proximidades situadas na sabuya, quinta do Saldanha (antiga quinta do marquez de Pombal) Seteaes, propriedade do antigo marquez da Praia. Considerados como objectos no tempo dos romanos ou mour0s, algumas pedras apresentam formas de machado do que são conhecidos machados romanos, também alguns fragmentos de louça também aparecidos na mesma propriedade. Pois consta que Cintra foi habitada tanto por mouros e romanos. No Museu dos Jeronymos também estão alguns objectos aparecidos aqui» .

Cintra, 4 de Outubro de 1924.

INVENTÁRIO

CERAMICA

1 - Fragmento de uma taça de cerâmica, lisa; o bordo não é decorado, teria 26,15 cm. de diâmetro.
2 - Fragmento de pequeno vaso de fundo esférico, de côr vermelha, não decorado, mal cozido, pois, enquanto a superfície externa apresenta uma côr vermelha, por redução, a interior apresenta a côr do barro. Pensamos na existência de um engobe de tradição neolítica.
3 - Fragmento de vaso, com faixa com ornamentação incisa.
4 - Fragmento de uma taça - tipo palmela - decoração incisa, dentes de lobo.

INSTRUMENTOS LITICOS

5 - Machado polido, de secção rectangular; trabalhado em quartzite escura, perfeitamente polido, gume embotado.
6 - Fragmento dum machado polido de secção circular.
7 - Machado polido, de secção rectangular, trabalhado em quartzite escura. Apresenta o gume embotado por polimento ulterior.
8 - Machado polido, de secção quadrangular, só polido nas faces maiores, trabalhado em quartzite cInzenta. A patina do gume é diferente da do resto do instrumento. Dá a impressão de que tentaram ulteriormente preparar um gume novo.
9 - Machado polido, de secção rectangular, trabalhado numa quartzite cinzenta escura, e muito pouco polido. O gume não é cortante e pode-se supor tratar-se não dum machado, antes de um polidor.
10 - Martelo, aproveitando um fragmento de anterior machado polido, de secção circular.
11 - Fragmento de machado.
12 - 13 - Discos rolados, trabalhados num fragmento de rocha dura. Têm colado um papel onde se lê: «Pedras com que os romanos ou mouros trituravam os ceriais. Informe do
Sr. Leite de Vasconcelos, Alfredo Bensaude e outros».



ALGUM ESPÓLIO DAS «THOLHOI» DO VALE DE S. MARTINHO - SINTRA

«Cintra 4- de Outubro de 1924
Estes objectos de pedra apareceram em uma propriedade de Manuel Joaquim d'Oliveira, no sítio denominado Vale de S. Martinho (Limite da Villa Estephania). Em umas sepulturas que actualmente existem. Os referidos objectos confirmados da idade da pedra pelo Sr. Leite de Vasconcelos e Alfredo Bensaude e outros Scientificos. Aparecem tambem laminas de cobre, o primeiro metal que aparece na transição da pedra para o referido metal, aparecem muitos mais objectos que estão no Museu dos Jeronymos, com indicação do meu nome e localidade dos objectos aparecidos».

Os objectos que sumàriamente se descrevem e apresentam, são acompanhados por 2 fragmentos de crâneo e 4 outros fragmentos de ossos longos.

INVENTÁRIO

INSTRUMENTOS LÍTICOS

14 - Machado polido, de secção rectangular, quase lenticular e protótipo dos machados de bronze, ditos planos, tem o gume preparado, porém algo esmurrado pelo uso. O lascado do gume está muito patinado e com a tonalidade geral. Uma das faces apresenta-se patinada de negro, enquanto a face mais polida e brilhante mostra aturado uso. Encontra-se fracturado mas colado e tem sinais de ter sido tocado por qualquer instrumento metálico - Possivelmente durante os trabalhos de escavação.
15 - Esferoide de calcáreo com uma patina terrosa, castanho avermelhada, igual à dos objectos votivos.
16 - Lâmina de fouce, trabalhada em silex branco, muito bem patinado. Não mostra um prévio polimento. A sua estrutura mostra um fino e miúdo trabalho de lascamento, nos bordos. Todo o corpo do instrumento é constituido por um lascado de grandes dimensões. Numa das extremidades e só numa das faces tem um sulco que se apresenta mais polido, talvez que pelo roçar do atilho que segurava a fouce ao cabo.

OBJECTOS VOTIVOS

17 - Ídolo cilíndrico, de calcáreo, sem qualquer decoração. As bases são sub-circulares e apresentam uma ligeira curvatura. Patina amarelo-castanho avermelhada, terrosa.
18 - Ídolo cilíndrico com as mesmas características do anterior.
19 - Ídolo cilíndrico de calcáreo poroso, com as outras características iguais aos anteriores, porém, de muito menores dimensões.
20 - Ídolo cilíndrico, de jaspe. É constituído por um cilindroide muito pouco polido de forma que se apresenta quase um prisma de base quadrangular, com as arestas fortemente arredondadas. Sem qualquer decoração. Bases polidas, embora não perpendiculares ao eixo da figura.
Patina perfeita, sem qualquer falha e da mesma côr e intensidade dos objectos anteriormente considerados.
21 - Flor de palmeira, de calcáreo idêntico ao dos ídolos cilíndricos anteriormente considerados.

OBJECTOS DE BRONZE

22 - Folha de lança, de bronze, pouco patinada, apresentando-se com uma tonalidade verde, com restos de antiga patina espessa, côr de azurite. Mostra, em diversos locais que foi intencionalmente limpa há pouco tempo.
23 - Escopro de bronze ou cobre. A patina foi também raspada modernamente em muitos pontos, pouco restando do seu aspecto primitivo.

Espera-se que estes materiais, objectiva e sucintamente publicados venham esclarecer alguns passos ainda obscuros da história de Sintra.
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